Por que CEOs permanecem em silêncio diante de Trump: a psicologia da lealdade corporativa e seus riscos

Neste artigo, analisamos por que C-suites optam pelo silêncio frente às surpresas de política do presidente Trump, explorando fatores psicológicos — como risco reputacional, sinalização ao mercado e os "animal spirits" — e impactos para governança, investidores e estratégia empresarial. A análise integra evidências do comentário reproduzido pela CNA e referencia a discussão de Gillian Tett no Financial Times, oferecendo recomendações práticas para conselhos e executivos que enfrentam incerteza política. Palavras-chave: lealdade de CEOs a Trump, silêncio do C-suite, incerteza política, animal spirits, risco reputacional.

Introdução

O silêncio conspícuo das lideranças executivas diante das repetidas surpresas de política promovidas pelo presidente Donald Trump tem atraído atenção de analistas, investidores e do público. Conforme destacado em comentário reproduzido pela CNA, “C-suites are conspicuously silent in the face of the US president’s policy surprises” (CNA, 2025). Essa omissão pública não é um fenômeno trivial: ela reflete um conjunto complexo de motivações psicológicas, organizational e de mercado que influenciam decisões estratégicas nas maiores corporações. Este artigo examina essas motivações, analisa os riscos — tanto econômicos quanto reputacionais — e propõe orientações para conselhos de administração, acionistas e executivos sêniores. As conclusões apoiam-se nas ideias trazidas pelo comentário publicado e em literatura sobre comportamento econômico, incluindo a referência a “animal spirits” de John Maynard Keynes, para oferecer um panorama aprofundado e aplicável a profissionais.

Contexto: políticas surpreendentes e o papel do C-suite

O cenário político dos últimos anos tem sido marcado por decisões e declarações presidenciais que frequentemente tomam de surpresa o mercado e as próprias empresas. Quando políticas públicas mudam de forma abrupta — seja em comércio exterior, regulação, política fiscal ou tecnologia — as empresas enfrentam a necessidade de responder rapidamente. No entanto, a resposta pública dos CEOs tem sido, em muitos casos, silenciosa ou cautelosa. Esse padrão levanta questões centrais: por que dirigentes que representam interesses econômicos relevantes optam por não comentar políticas que afetam seus negócios? Quais são os custos e benefícios dessa postura estratégica?

A análise do comportamento do C-suite deve considerar, simultaneamente, fatores internos (governança, cultura corporativa, relações com conselhos e acionistas) e externos (pressão regulatória, opinião pública, reação dos mercados). A decisão de falar ou permanecer em silêncio envolve cálculos sobre risco reputacional, impactos no preço das ações, alinhamento ideológico, e a vontade de manter acesso e influência junto ao governo.

Fator 1 — Risco reputacional e pressão de stakeholders

Uma das primeiras explicações para o silêncio executivo é o risco reputacional. CEOs e grandes empresas confrontam uma multiplicidade de stakeholders: acionistas, clientes, empregados, reguladores e a sociedade civil. Tomar uma posição pública contra o presidente pode provocar retaliação política ou boicotes de consumidores, além de gerar repercussões negativas entre eleitores favoráveis ao governo. Por outro lado, apoiar publicamente o presidente também pode alienar segmentos do mercado e da força de trabalho.

O cálculo reputacional é, portanto, delicado. Executivos avaliam se o custo de manifestar-se supera o benefício — e frequentemente concluem que o silêncio minimiza exposição e mantém opções abertas. Esse comportamento é reforçado quando as consequências econômicas imediatas de uma política não são claras, ou quando o impacto direto sobre a empresa pode ser mitigado por canais técnicos (lobby, assessoria jurídica) que não exigem exposição pública.

Fator 2 — Sinalização ao mercado e teoria dos incentivos

Os mercados financeiros respondem à percepção de estabilidade e previsão. Economistas e estrategistas frequentemente observam que a linguagem pública de líderes empresariais funciona como um potente sinal para investidores. Como citado no comentário reproduzido pela CNA, “A fourth factor is animal spirits, to cite John Maynard Keynes. Economists have always assumed that if businesses expressed public optimism, investors would feel the same” (CNA, 2025). Traduzindo e contextualizando: a expressão pública de confiança das empresas pode alimentar expectativas de crescimento e suavizar reações adversas.

Entretanto, a decisão de sinalizar confiança ou discordância é condicionada por incentivos de curto prazo. CEOs frequentemente têm remuneração vinculada ao desempenho anual ou de curta duração, o que os leva a priorizar estabilidade do preço das ações. Manifestar descontentamento público pode aumentar volatilidade e penalizar resultados de curto prazo. Assim, muitos executivos optam por gerenciar expectativas por meio de ações discretas, como comunicação direta com reguladores e participação em fóruns fechados, preferindo não emitir declarações públicas que possam prejudicar a valorização de mercado.

Fator 3 — Acesso, influência e cálculo político

Manter acesso às instâncias de decisão política é outro motivo crucial para o silêncio. Executivos que desejam influenciar políticas públicas podem preferir canais discretos de lobby e relacionamentos pessoais com autoridades. A exposição pública contrária ao governo pode queimar pontes e reduzir a eficácia de esforços de influência. Em regimes onde o presidente detém grande poder político e simbólico, a cautela aumenta.

Esse comportamento é consistente com a lógica do capital social e do poder institucional: preservar relações com o governo e os reguladores pode, em muitos casos, trazer benefícios mais valiosos e duradouros do que a satisfação imediata de pronunciar-se publicamente. Portanto, o silêncio pode ser uma estratégia consciente de maximizar influência por meios não públicos.

Fator 4 — Animal spirits, confiança coletiva e efeitos multiplicadores

A noção de “animal spirits”, mobilizada por Keynes e retomada no comentário, refere-se às emoções e ao otimismo que impulsionam a atividade econômica. Quando líderes empresariais transmitem confiança, eles podem catalisar investimento e consumo. O inverso também é verdadeiro: receios expressos publicamente por executivos podem amplificar pessimismo.

Assim, a dupla função dos pronunciamentos corporativos — como mensagem para investidores e como gerador de expectativas econômicas — pesa nas decisões de comunicação. Executivos ponderam se uma declaração crítica ao governo fortaleceria a posição de longo prazo da empresa ou se provocaria uma reação em cadeia que debilitaria confiança e investimento. Dado o poder de amplificação das declarações em era de mídia digital e redes sociais, a prudência predominante muitas vezes favorece o silêncio.

Governança corporativa e a divisão de responsabilidades

A governança das empresas modernas distribui responsabilidades entre conselho de administração, equipe executiva e departamentos jurídicos e de políticas públicas. Em muitas corporações, declarações públicas sobre política são sujeitas a aprovação e alinhamento estratégico do conselho, com especial atenção a riscos legais e regulatórios. Esse aparato formal pode, por si só, inibir pronunciamentos espontâneos dos CEOs.

Além disso, a existência de comitês de risco e compliance faz com que a comunicação corporativa seja mais cautelosa. Quando a governança prioriza previsibilidade e conformidade, a tendência é internalizar a gestão de choques políticos via estratégias técnicas (ajustes contratuais, planejamento de cenários) em vez de debates públicos.

Impactos econômicos: volatilidade, custo de capital e decisões de investimento

O silêncio do C-suite diante de políticas incertas não elimina os impactos econômicos. Pelo contrário, a ausência de sinais claros pode aumentar a incerteza interpretativa no mercado, levando a maior volatilidade. Investidores dependem de informação e liderança para avaliar riscos; a falta de orientação pública das maiores empresas pode ampliar premissas de risco sistêmico e elevar o custo de capital.

Empresas que optam por não comunicar podem ainda enfrentar dificuldades ao tomar decisões de investimento de longo prazo: a incerteza política sobre tarifas, subsídios, regulamentações tecnológicas e imigração pode inviabilizar projetos. Em muitos casos, a resposta preferida é o adiamento de investimentos ou a realocação de recursos para ambientes mais previsíveis, com impactos macroeconômicos relevantes.

Implicações para a legitimidade corporativa e sustentabilidade a longo prazo

A conduta das lideranças em períodos de tensão política afeta também a legitimidade social das empresas. Em um ambiente onde consumidores e empregados exigem posicionamentos éticos e transparência, o silêncio pode ser interpretado como conivência ou falta de compromisso com valores públicos. Isso é particularmente sensível quando políticas presidenciais se relacionam a direitos civis, meio ambiente ou comércio justo.

Consequentemente, há um trade-off entre preservar influência junto ao governo e manter credibilidade pública. A escolha pelo silêncio pode reduzir riscos de curto prazo, mas comprometer capital reputacional que se traduz em fidelidade de consumidores e atração de talentos — fatores cruciais para a sustentabilidade a longo prazo.

Estratégias alternativas: quando e como falar

Para mitigar os riscos associados ao silêncio e ao mesmo tempo preservar relacionamentos com autoridades, empresas e conselhos podem adotar estratégias comunicacionais calibradas:

– Delinear princípios claros: estabelecer políticas públicas internas que definam quando a empresa emitirá posicionamentos públicos, com critérios ancorados em valores corporativos e impacto material.
– Comunicação escalonada: iniciar com canais discretos (diálogos com reguladores, coalizões setoriais) e, quando necessário, avançar para declarações públicas coordenadas com outras empresas para diluir riscos individuais.
– Mensagens focadas em princípios e fatos: evitar retórica polarizadora; priorizar impacto econômico e propostas construtivas para políticas alternativas.
– Transparência seletiva: comunicar intenções estratégicas e avaliações de risco de forma que forneça sinalização ao mercado sem adotar tom partidário.
– Preparação de cenário: realizar análises de cenários que preparem stakeholders para eventuais políticas e que apoiem a comunicação com dados e projeções em vez de posições puramente políticas.

Essas alternativas permitem que empresas equilibrem o imperativo de influência com a necessidade de manter legitimidade pública e previsibilidade para investidores.

Recomendações práticas para conselhos e executivos

A partir da análise, recomendações para conselhos de administração e CEOs incluem:

– Avaliar governança de comunicação: garantir que processos formais existam para decisões de pronunciamento sobre política pública.
– Integrar análise política ao planejamento estratégico: considerar o risco político como variável explícita na avaliação de projetos e no custo de capital.
– Implementar limites temporais e métricas: definir quando a omissão se torna custo maior do que a exposição pública, com indicadores claros.
– Promover coalizões setoriais: atuar conjuntamente com pares para reduzir risco individual e aumentar legitimidade de posicionamentos coletivos.
– Priorizar transparência sobre intenção: explicar razões de silêncio quando apropriado, demonstrando que a empresa não está inativa, mas atuando por canais privados.

Tais medidas ajudam a alinhar o comportamento do C-suite com interesses de longo prazo, reduzindo ambiguidade para investidores e outros stakeholders.

Considerações legais e de compliance

Declarações públicas também têm implicações legais — desde riscos de disclosure seletivo até potenciais violações de regulamentações sobre lobby e financiamento político. Departamentos jurídicos devem estar integrados ao processo de decisão para avaliar exposição regulatória e risco de litígios. Além disso, empresas com presença global precisam considerar como posicionamentos nos EUA podem repercutir em outros mercados com diferentes sensibilidades políticas.

A coordenação entre compliance, relações governamentais e comunicação corporativa é, portanto, essencial para garantir que qualquer mensagem pública esteja alinhada às normas legais e aos objetivos estratégicos da companhia.

Reflexões finais: equilíbrio entre influência e responsabilidade

O silêncio dos CEOs diante de surpresas políticas do presidente Trump ilustra uma tensão central da liderança empresarial contemporânea: equilibrar a necessidade de influência e acesso com a responsabilidade social e a demanda por transparência. Conforme o comentário reproduzido pela CNA destaca, fatores como animal spirits, sinalização ao mercado e cálculo reputacional moldam decisões de comunicação (CNA, 2025).

Para profissionais do mundo corporativo, a lição principal é que a omissão é uma decisão estratégica com custos e benefícios. A gestão profissional requer que tais decisões sejam deliberadas, fundamentadas em análise de risco e alinhadas aos princípios institucionais. Conselhos e executivos que institucionalizarem critérios claros para posicionamentos públicos estarão melhor preparados para enfrentar choques políticos sem sacrificar legitimidade, valor de mercado ou capacidade de influenciar políticas de modo eficaz.

Referências e citação conforme normas ABNT:
No corpo do texto foram utilizadas referências ao comentário veiculado pela CNA. A citação direta e indireta do conteúdo seguiu a referência institucional (CNA, 2025). Exemplo de citação no texto: (CNA, 2025).

Fonte: CNA. Reportagem de . Commentary: The psychology of CEO loyalty to Trump. 2025-09-06T22:00:00Z. Disponível em: https://www.channelnewsasia.com/commentary/ceo-company-trump-loyalty-rating-policy-certainty-ai-5334311. Acesso em: 2025-09-06T22:00:00Z.
Fonte: CNA. Reportagem de . Commentary: The psychology of CEO loyalty to Trump. 2025-09-06T22:00:00Z. Disponível em: https://www.channelnewsasia.com/commentary/ceo-company-trump-loyalty-rating-policy-certainty-ai-5334311. Acesso em: 2025-09-06T22:00:00Z.

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